oi… tem alguém aí?
uma noite sonhei com a casa da vó Mariquinha em Mongaguá. durante muito tempo, na minha infância e adolescência, aquela foi a minha referência de praia, de casa no litoral, de viagem com amigos e passar a noite em claro para ver o sol nascer. a vó Mariquinha não é minha avó de sangue, mas de uma amiga muito querida e antiga, que me empresta muitas coisas nessa vida, inclusive as gentes queridas e a casa em Mongaguá.
a casa nunca foi dessas de sonho, tava mais pra uma casa meio engraçada, não tinha teto, não tinha nada. a cada novo verão, descobríamos uma coisa que faltava na casa, que havia sido roubada por gente, ou comida pelas traças, um novo foco de mofo ou musgo. arquitetos diriam que os cinco cômodos da casa só poderiam abrigar uma família com quatro pessoas, mas nós fazíamos caber vinte, trinta. na época, ninguém precisava dormir, muito menos com conforto.
a casa ficava na rua da rodoviária e de um supermercado grande, que no mês de janeiro tinha filas e faltava mercadorias. na parada dos ônibus eu aproveitava para usar o orelhão para ligar para os meus pais, dizer que estava viva, em uma época na qual celular ainda não era uma extensão de nós. minha mãe nunca se preocupou muito comigo sozinha na praia, eu nunca fui uma pessoa que se pudesse chamar de corajosa, especialmente quando o assunto é água. tenho medo sim, medo de ser levada, de meus braços e pernas não serem suficientes para tanto mar.
a casa ficava num bairro cheio de casinhas do mesmo estilo, salpicado com pouco comércio local, muita criança jogando bola, um punhado de vira-latas e um tanto de adultos procurando o que fazer. as ruas do bairro eram feitas de pedras hexagonais e a cada cinco ou seis casas a gente via um terreno cheio de mato.
a casa tinha uma garagem que nos dias de calor mais intenso servia de alento. ficávamos na rede, ou nos colchonetes estendidos no chão. jogar cartas, cantar, conversar sobre o quê? não consigo me lembrar. mas a gente descobria também o amor, o arrepio do carinho na pele, das vontades de adolescente. a gente fingia sempre que sabia demais.
a casa era abrigo, mas era também passagem. caminhávamos de manhã para a praia, uns 15 minutos, cadeira, esteira, bolsa, protetor, bola. de noite tinha passeio na feirinha. ah a instituição feirinha hippie do litoral! barraquinhas com bijuterias, artesanato, tatuagem de henna, pastéis, espetos de morango com chocolate. esse passeio valia até gastar nossa melhor roupa.
a casa hoje já não é mais da Mariquinha, não sei de quem é, como está, se já despencou. procurei uma imagem recente na internet, na esperança de algum satélite ter o mesmo carinho que eu pela casa de Mongaguá. encontrei a rua da rodoviária e vi muitas casinhas. talvez seja uma delas. já não sei. me parecem todas iguais.
até a próxima,
Carol
Muuuuuuito bom, Carol.
Remeteu-me ao meu passado em Pontal do Sul, Paraná ❤️
Fiquei super emocionada. Lembrança boa. Tem que dar um jeito dessa carta chegar na Meire. Ela vai amar.