oi… tem alguém aí?
começar a sair com alguém, ter a fase da paquera e o início de um relacionamento são fases bem gostosas. podemos concordar com isso antes de eu começar essa carta?
aquela dança de borboletas no estômago ao ver a pessoa, não ter muita certeza ainda no que vai dar aquilo, o sorrisinho tímido que a gente solta ao ler uma mensagem enviada no meio do dia, descobrir quais são os gostos e interesses do ser desejado - aliás, desejar e ser desejada com intensidade está nessa lista, né? -, marcar encontros e se preparar para eles. esse é um combo bom de ser vivido.
mas é também uma fase em que a gente acaba meio que inconscientemente (talvez às vezes seja consciente) vivendo uma personagem. baseada em fatos reais, ok, mas, ainda assim, estamos representando um papel a partir daquilo que imaginamos que é esperado de nós ou com elementos do quem gostaríamos de ser, mas não somos completamente.
quando eu comecei a sair com o meu marido (então apenas paquera/ficante), eu tinha certeza que ele era um boêmio - e ele pensava o mesmo de mim. nos conhecemos em uma festa de formatura de psicologia da PUC (não das que vestimos traje “esporte fino”, mais estilo open bar de vodka e cerveja baratas) em que ele foi tocar com a banda de samba da qual fazia parte na época. eu fui meio arrastada pela minha chefe da época, que conhecia o pessoal da banda e planejava me apresentar para uns cinco amigos - um deu certo, veja só!
nessa mesma festa nós ficamos e, no dia seguinte, ele pediu meu telefone para minha chefe. não existia whatsapp ou instagram nesta era pré-histórica, de modo que ele me ligou e me chamou para sair. naquela semana eu tinha combinado de ir ao Ó do Borogodó (bar de samba aqui de SP) com uns amigos da faculdade e falei para ele me encontrar lá. eram duas vezes seguidas dos dois aproveitando a “noite paulistana”. ou seja, tínhamos certeza que estávamos diante de pessoas noturnas e baladeiras.
não podíamos estar mais enganados. ainda bem que na segunda vez que saímos, o “date” já foi comer batatinha frita em um bar tranquilo e não precisamos ficar até às quatro da manhã ouvindo som alto em um lugar apertado fingindo sermos descolados.
aí é que chega minha defesa dos relacionamentos longos. é com eles que conseguimos atingir a máxima potência da intimidade de sermos quem quisermos ser, inclusive em um encontro romântico. esses momentos, apesar de ficarem mais raros conforme passa o tempo (especialmente se você inclui uma filha na equação), quando acontecem, podem também ficar mais leves e autênticos. podemos ir a lugares onde sabemos que os dois vão aproveitar, ficar o tempo que quisermos e, no final, os dois voltarão para casa - com sua própria cama, banheiro, pijama, televisão, geladeira.
na última sexta-feira, eu e o marido tivemos a conhecida “vale night”: Catarina dormiu na casa da avó e nós tivemos horas preciosas só para nós. aproveitamos para conhecer um bar que eu tava de olho há um tempo, comida boa, drinks autorais, ambiente descolado (do jeitinho que paulistano metido a besta gosta). não estava muito frio, então sentamos em uma mesa na calçada, pedimos um drink cada um e uma porção divina de croqueta de cogumelo (um amigo mineiro disse que croquete está na moda em SP, guardarei o assunto para outra carta). na hora de escolher mais um drink, um de nós falou para o outro, meio constrangido: “vamos pedir só um e dividir? tô precisando muito ir no banheiro de casa!”.
percebe como essa é uma frase quase inconcebível em um primeiro, segundo, terceiro ou até décimo encontro? é preciso estar confortável com alguém para interromper um momento gostoso com essa sentença física, escatológica.
mas, estando em um relacionamento longo, cheio de histórias, memórias, sem tempo para se abalar com algo tão trivial, o outro de nós dois apenas respondeu: “vamos! também preciso muito. ainda bem que temos mais de um banheiro em casa!”.
e não preciso dizer mais nada. está aqui a minha carta manifesto em defesa dos relacionamentos longos. encerro meu caso.
até a próxima,
Carol
a intimidade que só se adquire com a longitude.
também sou do time dos monogamáticos. e ah, o começo da paixão é uma delícia mesmo. eu viro um escritor de mão cheia. nada como ela. mas nada como, também, o amor que vem depois!